Há alguns meses estamos vivendo
em outra sintonia com o mundo, com as pessoas e com nós mesmos. Moramos numa
casa com quintal e isso tem nos transformado a cada dia. Pode parecer um
simples fato, algo banal, mas para nós, que desejávamos há tanto tempo, está
sendo transformador, a medida que a natureza penetra em nosso ser, o sol nos
aquece o balanças das árvores nos move adiante e o canto dos pássaros nos
preenche. A natureza aqui é abundante e pura, bruta, sem jardim planejado e
canteiro feito. As árvores crescem naturalmente e o que se vê pela janela é
verde até o horizonte.
Logo que nos mudamos imaginei que
passaríamos horas no quintal, que o Nathan brincaria de mil e uma formas, assim
como brinca na escola. Achei que construiria castelos, subiria em árvores,
mexeria na terra e mergulharia de forma intensa nesse espaço novo. Mas não foi
assim que aconteceu... Fiquei tentando entender, tentava inventar brincadeiras
e fazer novas descobertas lá fora. Às vezes funcionava, outras vezes ele pedia
para voltar para dentro. Ficava me questionando por que ele não ficava no
quintal, como eu achava que deveria ficar. Não obtive resposta!
O tempo passou e cada final de semana fomos trabalhando para arrumar nossa casa e transformá-la em nossa. Meu marido sempre pegava ferramentas em um ranchinho que o dono da casa permitiu que usássemos. E lá o Nathan também encontrou suas ferramentas para fazer seus trabalhos e ajudar os adultos. Ele ficou encantado ao mexer com machadinho, enxada e pá. Começou suas construções, a janela de um prédio. Cada um que nos visitava ajudava na sua obra e assim ele foi se apropriando do nosso quintal. Todos os dias eu abria o ranchinho para ele pegar suas ferramentas e trabalhar. Estava encontrando seu espaço de brincar. Começou a criar muitas coisas, tentou subir em mais árvores e encontrou seu lugar no mundo, no pé de “figos”, como ele diz. Todos os dias ele sobe nessa árvore para afiar suas ferramentas, montar armadilhas, amarrar cordas, inventar histórias, contemplar a natureza. Enfim, brincar abundantemente, como sempre achei que brincaria quando tivéssemos um quintal.
O tempo passou e o vínculo se
formou. Não somos mais uma família que se mudou para esta casa. Nós somos esta
casa, nós somos este quintal e esta natureza está dentro de nós. Percebi que
isso não é imediato, que o tempo é necessário para esse reconhecimento e
entrosamento. Como é bom poder olhar para tanta beleza todos os dias, mas, mais
do que isso, é fazer parte dela, interagir, criar e absorver o que vem dela. E
é isso que estamos fazendo! Começamos uma horta, fizemos fogo de chão,
descobrimos um lindo bambuzal no terreno ao lado, ganhamos um balanço...
Estamos plantando, mas já estamos colhendo: sorrisos lindos, crianças
tranquilas, brincadeiras sem brinquedos, pé no chão, muitas ideias e milhares
de execuções. Ágatha que antes ficava parada ao meu lado no quintal agora
engatinha tranquilamente, brinca com a areia, passa pela vala, se levanta, pede para ir no balanço. O Nathan é desbravador, sempre tenta algo diferente
nas árvores e adora balançar a irmã no balanço. Felicidade em ver que este quadro
é a nossa vida emoldurado por natureza e preenchido por ela também.
Dar tempo ao tempo não é fácil. Todo dia olho minha horta pela janela para ver se as plantinhas já cresceram alguns centímetros. Mas, se deixamos o tempo agir, tudo floresce, tudo ganha vida e tudo vai além do que imaginávamos, é só esperar!
Se temos de esperar,
que seja para colher a semente boa
que lançamos hoje no solo da vida.
Se for para semear,
então que seja para produzir
milhões de sorrisos,
de solidariedade e amizade.
(Cora Coralina)
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