terça-feira, 14 de maio de 2013

Tornar-se desnecessária



   A vivência materna me leva a mudanças constantes de pensamentos, reflexões profundas sobre atitudes e buscas intensas por melhores condutas. Mas nada disso interfere em meus princípios, apenas eles se mostram com raízes mais fortes e se ramificam à medida que vou vivendo.
   Nesse “mês materno”, quando se comemora o dia das mães, tenho pensado na importância de me tornar desnecessária na vida de meu filho. Não como forma de abandono, descaso ou passividade, mas como uma conduta natural a ser seguida conforme ele cresce.
   Confesso que pensar nisso, inicialmente, parece um pouco desagradável e meu coração reluta, pois até pouco tempo atrás havia uma necessidade constante de me doar ao meu filho. Doação de tempo, de amor, de brincadeiras, de fazer por ele o que ainda não conseguia... E tenho certeza que ser mãe é se doar, entretanto o que está embutido nesta palavra se modifica à medida que o filho cresce e a mãe amadurece. E são essas mudanças que causam  desconforto.
   Ele cresceu, não é mais um bebê. Suas necessidades mudaram e o meu ato de doação precisa acompanhar esta mudança. Tornar-me desnecessária passa a ser um ato de doação na sua vida, onde saio da frente ou do seu lado para que ele siga sozinho naquilo que já é capaz e que se sente capaz para fazer. E quando ainda não for, preciso incentivá-lo a ser.
   Não sou mais necessária em sua alimentação sendo os braços que levam comida até a boca. Ele maneja muito bem os talheres. Apenas faço companhia para aquele momento, estimulo e ajudo em algumas garfadas. As brincadeiras não dependem mais tanto de mim. Ele pega os brinquedos, tem as ideias, inventa as histórias e brinca. Eu apenas observo, supervisiono e participo quando sou solicitada. Ele percebe suas necessidades e emoções, quando está com fome, quer ir ao banheiro, fica triste ou bravo. Eu o ajudo para que possa se conhecer melhor.
  
   Quando começou a natação o Nathan quase nem conseguia mergulhar e se afogava. Eu precisava estar atenta para que ele não ficasse muito tempo embaixo da água. Hoje, após poucos meses, ele mergulha por longos períodos, nada sem auxílio e diz: “qué nada sozinho”. A cada aula estou me tornando mais desnecessária e em breve estarei olhando sua aula pela janelinha.
   Tornar-se desnecessária é um processo difícil se analisarmos pelo lado egoísta em querer o filho sempre perto e debaixo da nossa asa. Mas essa transformação de doação pode ser magnífica quando olhamos o caminho que já foi trilhado e percebemos que todo o amor está se transformando em segurança e que todo o esforço está levando os filhos mais longe.

   
   Percebo que a minha doação na vida do meu filho está se transformando. Coisas que fazia antes não precisam mais ser feitas e outras atitudes assumem esse lugar. Parar por alguns instantes e deixa-lo ir tornou-se um grande ato de amor. O fazer sozinho que ele às vezes pede é a construção de uma auto-afirmação, da certeza de que ele é capaz, de que pode ir sozinho e de que sabe fazer. Deixá-lo fazer é me doar. Há alguns meses, estimulá-lo a fazer, a ir com outras pessoas, a brincar sozinho era a minha doação em sua vida. Agora me sinto um pouco expectadora, observando e vendo-o florescer. Como uma árvore que plantamos e algum tempo depois sai da terra e vai crescendo, tomando forma, ganhando força, até tornar-se uma grande árvore, que serve de sombra para as pessoas e floresce.
   Estou vendo algumas flores, lindas flores. A cada dia me certifico de que observar este florescer é um ato de amor e uma alegria também, pois vejo  que minhas escolhas estão gerando lindas flores. Também observo  que os padrões do mundo não servem para nada a não ser para você ficar desanimada, pois seu filho ainda não atingiu aquela etapa do desenvolvimento ou precisa adquirir certa aptidão ou comportamento. Cada árvore floresce em um tempo, pois para tudo á um tempo nesta vida.
  
   Me doar observando faz amar ainda mais o que eu faço, que é educar meu filho. Me dá convicção de que amor gera amor e gerar amor deixa as pessoas felizes. Me faz ver que plantar às vezes parece um trabalho tão insignificante, sem valor ou sem resultado, mas que a seu tempo embeleza o mundo com flores, lindas flores que todos apreciam quando passam.
   Tornar-me desnecessária traz novos sentimentos e emoções, nem menores, nem maiores, apenas novos para um coração já repleto das novidades que a maternidade apresenta todos os dias.
Tornar-me desnecessária me ensina a ser livre, pois me doar desta forma é ensinar a liberdade e a gente ensina aprendendo ou aprende ensinando.


"A nossa mais elevada tarefa deve ser a de formar seres humanos livres que sejam capazes de, por si mesmos, encontrar propósito e direção para suas vidas. (Rudolf Steiner)



   Há medida que as situações foram acontecendo e se sucedendo no meu dia a dia, fui refletindo sobre este assunto. Muitas vezes gerou angústia e pensamentos negativos em relação ao meu papel de mãe. Mas nenhuma reflexão tornou-se tão clara como a que tive hoje após finalizar a leitura do texto abaixo, que li em uma das muitas homenagens às mães nas redes sociais.


"Vossos filhos não são vossos filhos.
São os filhos e as filhas da ânsia da vida por si mesma.
Vêm através de vós, mas não de vós.
E embora vivam convosco, não vos pertencem.
Podeis outorgar-lhes vosso amor, mas não vossos pensamentos,
Porque eles têm seus próprios pensamentos.
Podeis abrigar seus corpos, mas não suas almas;
Pois suas almas moram na mansão do amanhã,
Que vós não podeis visitar nem mesmo em sonho.
Podeis esforçar-vos por ser como eles, mas não procureis fazê-los como vós,
Porque a vida não anda para trás e não se demora com os dias passados.
Vós sois os arcos dos quais vossos filhos são arremessados como flechas vivas.
O arqueiro mira o alvo na senda do infinito e vos estica com toda a sua força
Para que suas flechas se projetem, rápidas e para longe.
Que vosso encurvamento na mão do arqueiro seja vossa alegria:
Pois assim como ele ama a flecha que voa,
Ama também o arco que permanece estável." (Khalil Gibran)


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