quarta-feira, 16 de outubro de 2013

O presente precioso





   Nunca tive grandes riquezas materiais, não nasci num palácio e nem tenho grandes ambições na vida. Nunca viajei para fora do país e nunca tive condições de ter as melhores roupas, bolsas e sapatos. Estudei numa faculdade particular com muito esforço, vendo desfiles de moda e carrões, enquanto eu ia de ônibus e esses carrões nem paravam para oferecer carona.  O sonho da casa própria ainda parece distante de alcançar, assim como o de um carro melhor  e outras coisas que é possível com o dinheiro.

   Nesse mundo capitalista parece que estas são as coisas mais importantes do mundo, as quais devem ser as primeiras frases de um texto, o título de um livro e a motivação para suportar um trabalho chato. Não ter é sinônimo de desânimo, insatisfação e infelicidade. Mas o não ter me ensinou a ter outras coisas, que antigamente, na minha imaturidade de adolescente e jovem adulta não percebia o quão valioso era. Não ter o que muitos tinham me ensinou a ter o que muitos não têm e até hoje buscam sem nem saber. 


   
   Eu aprendi a ser honesta e verdadeira, a valorizar pequenos gestos e presentes feitos pelas minhas mãos. Também aprendi que os presentes mais significativos são aqueles feitos por mim e não comprados em grandes lojas. Valorizar o que se tem é muito melhor do que aquilo que não se tem. Isso gera contentamento, o que não me impede de sonhar e lutar pelo o que quero, mas aceitar e ser feliz com o que tenho no momento. Aprendi também, que ser feliz consiste em apreciar as coisas simples, como o sorriso de uma criança, um por do sol, uma tarde agradável no parque, uma conversa gostosa. Isso me enriquece e enche meu coração de alegria.

   Ser feliz é viver e para viver não precisa ter dinheiro, pois viver consiste em muito mais que isso, é desfrutar do tempo, das oportunidades, das pessoas, dos lugares e muitos desses desfrutes não é o dinheiro que proporciona. Muitos têm dinheiro e não vivem, ou por não saberem ou por não terem tempo para isso. 


   Depois que me tornei mãe essas riquezas que tenho no coração transformaram-se em presentes, que dou ao meu filho a cada dia com muito amor. Ainda não posso dar presentes de lojas, os brinquedos e roupas ele ganha de pessoas queridas. Muitos deles gostaria de dar, e as vezes fico triste por isso, mas quando o vejo feliz, cheio de amor no coração se relacionando alegremente com as pessoas e deixando-as felizes com sua companhia percebo que aquilo que dou para ele é o maior presente, um tesouro que não tem valor, o presente precioso, meu tempo. O tempo em que poderia estar trabalhando para ganhar dinheiro e comprar presentes e lanches para o Nathan estou passando com ele, oferecendo presentes para seu coração e alimento para sua alma. E isso não se encontra em nenhuma loja, em nenhum shopping e não é possível fabricar, apenas pode ser cultivado dentro do coração. É isso que estou ensinando ao meu filho diariamente, no tempo que passamos juntos.

   E ele está aprendendo... Com três anos sabe o valor de um abraço, de um beijo e também sabe que um abraço pode ser temperado com “eu te amo”. Também aprendeu que existem palavras mágicas muito importantes: por favor, obrigado, com licença e desculpa. Estar feliz por ter brincado com alguém ou ter recebido uma visita é mais importante do que o fim da brincadeira ou o “tchau”da visita. A beleza das flores é maior do que a de um brinquedo. A música preenche o coração e o barulho dos carros incomoda. O colorido do céu enche os olhos, assim como a escuridão dele nos avisa que é hora de dormir. Ser amoroso é não gritar com as pessoas e falar com educação. Uma formiga é tão importante quanto um cachorro e paramos para olhar os dois quando passeamos no parque.

   E é isso que aprendemos no tempo que passamos juntos. E esse aprendizado vai além de livros, estudos, aulas e televisão. Carregamos os tesouros do coração por toda nossa vida. Eles sustentam nossas escolhas, peneiram as amizades, filtram o que ouvimos e vemos e são a base para sobreviver às adversidades da vida. Nos fortalecem na luta e não permitem que nossos sonhos morram mesmo que pareçam impossíveis.

   São esses tesouros que me fazem continuar lutando pelo que acredito e me mantendo com convicção nas escolhas que faço, as quais aos olhos do mundo não parecem tão boas assim, mas para mim, são a felicidade plena, a certeza de um mundo melhor, onde invisto tempo e amor e recebo muito mais do que dou. Isso não existe no mundo lá fora, mas se cultivarmos pode ser mais real e comum a todos.

Alguns bordam tecidos,
outros tecem caminhos.
Alguns constroem casas, 
outros se tornam ninhos.
Alguns preparam refeições,
outros são alimento.

Alguns esparramam conversas,
outros juntam silêncios.

Uns pintam telas,
outros tingem almas.
 
Uns perfumam,
outros devolvem essências.

Alguns divertem os sentidos,
outros convertem corações. 
Lilian Udar





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